Investimento em pesquisa e em novas tecnologias melhora a
qualidade da cerveja brasileira e os custos de produção.
O Brasil é o terceiro maior produtor e um dos grandes
consumidores de cerveja do mundo. São fabricados 13,8 bilhões de litros por
ano, o que coloca o país no ranking global atrás apenas da China e dos Estados
Unidos.

Na última década, o consumo aumentou a uma taxa média de 5%
ao ano, com destaque para o segmento de cervejas artesanais, que teve uma
evolução anual em torno de 20%. Com um mercado tão robusto, várias iniciativas
inovadoras são fomentadas nas universidades, cervejarias, institutos de
pesquisas e por agricultores. Unidos em um esforço conjunto para melhorar a
qualidade do produto e reduzir os custos de fabricação, eles são responsáveis
por um leque de inovações relacionadas tanto ao processo produtivo quanto ao
cultivo no país dos principais ingredientes da bebida além da água: cevada,
lúpulo e levedura. “A indústria cervejeira brasileira é formada por mais de 50
complexos fabris com tecnologia de padrão mundial”, diz Paulo Petroni, diretor
executivo da Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil),
entidade que reúne os maiores fabricantes do país.
Um exemplo do esforço inovativo do setor ocorre com a cevada,
principal fonte de amido da bebida. Mais de 90% do grão plantado no país é
fruto de pesquisa nacional. Criado há 40 anos, o programa de melhoramento
genético liberado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) já
lançou no mercado 30 novos cultivares de cevada cervejeira adaptada às
condições de clima e solo. “Com os nossos cultivares, conhecidos pela sigla
BRS, a produtividade mais do que triplicou. Nos anos 70, colhíamos por volta de
1 tonelada de cevada por hectare e agora chegamos a 3,5 toneladas por hectare”,
informa o engenheiro-agrônomo Euclydes Minella, responsável pelo programa na
Embrapa Trigo, em Passo Fundo(RS). “As novas variedades do grão que
desenvolvemos ajudaram a consolidar a lavoura de cevada cervejeira. Hoje, temos
cultivares mais produtivos, com perfil superior de resistência a doenças e de
melhor qualidade industrial. Dificilmente, sementes de cevada importadas vingam
no país. As variedades desenvolvidas aqui são muito competitivas comercialmente.”
Quando foi criado, o programa pretendia substituir a cevada
usada pelas cervejarias que, naquela época, era toda importada. Esse objetivo
ainda não foi atingido. A produção nacional de 300 mil toneladas por ano
(t/ano) do grão, de acordo com a Embrapa, atende a 43% da necessidade da
indústria brasileira para a produção de malte, nome dado ao cereal germinado
seco usado na fabricação da bebida (ver o infográfico com as principais etapas
do processo de fabricação da cerveja). Para suprir a demanda dos fabricantes, o
Brasil compra cerca de 400 mil t/ano de cevada de produtores argentinos,
europeus, norte-americanos e canadenses.
Novas Fronteiras
Gramínea parecida com o trigo, a cevada (Hordeum vulgare) é
originária do Oriente Médio. Foi domesticada inicialmente na antiga
Mesopotâmia, região onde hoje estão Iraque e a Síria. É uma cultura anual, com
a semeadura no Brasil de maio a julho e a colheita entre setembro e novembro.
Na última década, o plantio se concentrou no Rio Grande do Sul e Paraná,
estados que têm características climáticas propícias ao pleno desenvolvimento
da planta. Juntos, respondem por mais de 90% da produção nacional. Por meio das
pesquisas da Embrapa, a lavoura tem ampliado suas fronteiras e hoje já é
possível produzir o grão em escala comercial em São Paulo, Goiás e Minas
Gerais. “Lançamos até 2013, em parceria com a Malteria do Vale, de Taubaté
(SP), as variedades BRS, Sampa, Manduri e Itanema para cultivo nas lavouras
irrigadas de São Paulo”, conta Euclydes Minella. “Em São Paulo, responsável por
cerca de 5% da produção do grão, 100% das plantações são formadas por
cultivares da Embrapa”.
A cooperação entre a Embrapa e produtores, maltarias
(fábricas que transformam a cevada em malte) e fabricantes de cerveja, segundo
Minella, está na base do sucesso do programa Embrapa de melhoramento da cevada.
“As quatro maltarias instaladas no país duas da Ambev, no Rio
Grande do Sul, uma da Cooperativa Agrária Industrial, em Guarapuava (PR), e uma
da Maltaria do Vale, em São Paulo – são parceiras da Embrapa”, informa Minella.
Outro fator que explica o êxito da iniciativa é a tecnologia por trás da
criação dos novos cultivares. “Pelo método tradicional de melhoramento
genético, um novo cultivar leva pelo menos seis anos para fixar suas características
genéticas. Depois disso, são necessários mais quatro anos em testes de campo
para avaliação de rendimento, da qualidade do grão e de resistência a doenças”,
explica Minella.
Na Embrapa trigo, os cientistas usam a técnica de
haplodiploidização, com o desenvolvimento in vitro de plantas derivadas de
gametas (células reprodutivas), portadoras da metade do genoma, que de forma
espontânea ou artificial dá origem a linhagens duplo-haploides. “Assim,
geneticamente em apenas uma geração, ao invés de seis ou mais com o processo
convencional obtendo um novo cultivar em sete anos”.